sexta-feira, 30 de novembro de 2012

A patriotada da ditadura que atrapalha o futebol brasileiro

Texto que escrevi para o Blog do Juca Kfouri, publicado no início da tarde de hoje.

----

“Brasil, ame-o ou deixe-o”.

Este era o slogan adotado em diversas campanhas publicitárias durante a ditadura militar no Brasil, especificamente no período em que o país foi governado pelo general Emílio Gastarrazu Médici.

Este é também o raciocínio do filhote daquele nebuloso e nada saudoso regime, responsável por comandar o futebol brasileiro: José Maria Marin, atual presidente da Confederação Brasileira de Futebol.

O discurso inflamado de Marin ao final da coletiva de apresentação do novo treinador da seleção brasileira, Luiz Felipe Scolari, foi teatral.

Mostrando-se indignado contra aqueles que defendiam um estrangeiro, no caso o vitorioso Pep Guardiola, para o cargo de comandante do time da CBF, vociferou, gesticulou, bateu na mesa.

Incorporou todas as características de político desenvolvidas nos tempos de deputado, vice-governador e governador biônico.

Em seu discurso, exaltou o nacionalismo, o patriotismo. “Precisamos dar valor às nossas coisas, aos nossos patriotas, e a nós mesmos”.

Sim, precisamos. E, do mesmo modo, precisamos entender que os tempos são outros. Vivemos num mundo globalizado, no qual cada vez mais se sabe o que acontece em diferentes continentes de modo instantâneo. Com o futebol não é diferente.

Com relação ao futebol brasileiro, a insatisfação com o modus operandi é notória – desde a administração até o modelo de jogo adotado.

E as críticas não se restringem às observações feitas pelos brasileiros. No ano passado, a respeitável revista inglesa “Four Four Two” publicou uma reportagem de capa em sua edição de julho na qual destacava a “morte” de nosso futebol.

Mais recentemente, para ser exato na última quarta-feira, durante a Soccerex, feira de negócios voltados ao futebol que ocorre no Rio de Janeiro, Paul Breitner, campeão mundial com a Alemanha em 1974, fez novas críticas ao jogo brasileiro.

Segundo o ex-craque alemão, o Brasil “parou no tempo”. E ressaltou que é preciso voltar os olhos para a Europa e observar modelos vitoriosos com verdadeiro destaque.

Exemplos? Ele cita a seleção espanhola, atual campeã do mundo e bicampeã da Europa, e o Barcelona.

Este Barça, hoje com Tito Vilanova como treinador, que sob a liderança de Pep Guardiola encantou o mundo e despertou debates sobre o seu modo de jogar futebol: posse de bola, movimentação constante e velocidade.

Depois de golear o Santos de Neymar no Mundial de Clubes 2011, Guardiola justificou a apresentação de sua equipe amparando-se no futebol brasileiro: “O que tentamos fazer é tocar a bola o mais rápido possível. Na verdade, é o que o Brasil sempre fez, segundo me contavam meus pais e meus avôs”.

Atualmente, o que se pratica nos estádios brasileiros não é fonte de inspiração. Pelo contrário, é motivo de questionamento e críticas, internas e externas, como se viu na matéria da “Four Four Two” e na análise de Paul Breitner. 

O talento dos jogadores brasileiros é inquestionável. Eles continuam despertando o interesse de grandes clubes do exterior.

No entanto, nossos treinadores adotam estilos antagônicos àqueles que façam da reunião de atletas promissores que surgem ano após ano um conjunto que encante e promova – em conformidade com as exigências físicas da atualidade – um futebol mais próximo daquilo que a seleção brasileira e clubes do passado costumavam apresentar.

Olhar para fora é importante. Mas quando se tem a oportunidade de fazer um convite ao treinador mais bem sucedido dos últimos anos – Pep Guardiola –, não há como descartar esta opção por questões patrióticas, por mais conquistas (mundiais, inclusive), por mais respeitáveis que sejam as carreiras de profissionais brasileiros como Scolari e Parreira.

Não se trata de desmerecê-los. É preciso entender que o Brasil, o futebol brasileiro, precisa de mudanças. Ao acompanhar de perto um treinador de modelo reconhecidamente prestigiado como Guardiola e que, segundo o próprio, tem a influência do futebol brasileiro do passado, poderíamos promover uma nova mentalidade entre os treinadores do país.

O torcedor e cidadão brasileiro merece ver a arte do futebol ser reconhecida novamente lá fora. Não pode nos bastar que qualquer estrangeiro, quando se fala de futebol no Brasil, lembre de nomes: “Pelé”; “Garrincha”; “Ronaldo”; “Neymar”...

É imprescindível o resgate de nomes compostos do presente visando o futuro, como foi no passado: “a seleção de 70”; “a seleção de 82”; “o Santos de Pelé”; “o Flamengo de Zico”; dentre outros esquadrões que foram brilhantemente formados.

Para isso, é preciso mudar. Para isso, é preciso ter a humildade de que podemos tirar lições do futebol vindas de outros países. E não será com a mentalidade ditatorial do “ame-o ou deixe-o” que conseguiremos.

Como já dito, são outros tempos. Tempos que o nosso futebol – dentro e fora de campo – não tem conseguido acompanhar.

O alemão Paul Breitner mostra conhecer o futebol brasileiro melhor do que quem o comanda.

Nenhum comentário:

Postar um comentário